sexta-feira, 9 de março de 2012

LEMBRANDO KAFKA

Faz um tempo venho conversando com os mais chegados sobre a transformação que vai sendo consumada nos docentes da rede pública estadual aqui no Rio de Janeiro.

É claro que não é de hoje, sem dúvidas faz parte de um processo. Um processo que começou com o enfraquecimento das entidades representativas da classe (sem querer entrar no mérito da contribuição involuntária ou não dos seus dirigentes), passando pela gradativa degradação dos meios e condições do trabalho docente, atravessando pela sujeição do professor a um salário incompatível com sua formação e atribuições e por último na intenção de submeter por completo o docente à mera condição de "peão da educação".

Nem sequer seremos mais "operários da educação"; pois estes pelo menos supõe alguma função de importância dentro de um sistema de funcionamento, além - é claro - de sugerir algum tipo de organização e consciência de classe.

Sem querer desmerecer os valorosos operários/trabalhadores da construção civil, mas a alcunha de peão é usada de maneira pejorativa para apontar aqueles que são simples indivíduos-peças que são movidas ou retiradas sem que haja qualquer preocupação com o seu lugar, pois são substituiveis e descartáveis. Assim querem (e aos poucos parece que lograrão êxito) aqueles que gerenciam a educação estadual pública com filosofia empresarial importada que não abre espaço ao diálogo, retira a autonomia e toma as decisões em mão única sempre na vertical (de cima para baixo).

Vocês sabem que quando a iniciativa do governo é producente eu assino embaixo, e já fiz isso aqui no blog. Então, não que eu seja avesso "às transformações necessárias a educação pública para que a escola pública chegue ao século XXI", este papo pra mim é falácia de quem não sabe pensar a escola como um bem público e como bem público as transformações devem ser realizadas em prol da maioria, e a maioria quer qualidade e não quantidade (índices melhores que servem apenas aos ouvidos da elite política que controla a burocracia estatal da educação).

A escola pública do séc.XXI que estão querendo criar é a escola da fórmula pronta, conforme acreditam que surgirá se seguirem o manual da filosofia empresarial importada que os orienta. Então deixem-me avisá-los, não vai acontecer! E não vai acontecer simplesmente porque dentro da própria filosofia há situações em que a ação do órgão gestor da educação pública estadual (leia-se SEEDUC/RJ) atua contra.

Eu explico, no manual há a idéia de que o ambiente de trabalho escolar seja um ambiente saudável. Mas como um ambiente de interação entre profissionais pode ser saudável se os profissionais são constantementes vilipendiados no seu fazer profissional pelo órgão gestor ? Como ele faz isso ? Eu respondo, limitando infraestrutura básica, impondo restrições, cerceando ações criativas, experiências inovadoras, impedindo a autonomia pedagógica, aparelhando postos especificos dentro da escola com agentes de seus interesses e - o que é pior - colocando os professores uns contra outros. Coisas que vocês já conhecem, não é mesmo ?

Preciso apontar mais ? Acho que não.

Finalizando - para podermos retornar ao ponto da transformação do docente em algo bizarro - a escola do séc.XXI não se faz adquirindo computadores [muitas vezes em número insuficiente e os deixando sem manutenção quando necessário] e pondo-os em espaços exíguos dentro da escola; mas antes de tudo - além de adquirir equipamentos e oferecer cursos na área (ah, isso - o curso - eles estão fazendo. Pelo menos isso, né?) - se deveria estar atento ao docente como sendo um dos elementos essenciais para a efetivação da escola proposta.

Infelizmente não é o que acontece, pois para o professor estão designando um novo papel na escola e é um papel descartável. Ou seja, um cujo uso é nada nobre (peço perdão pela sugestiva pouco delicada). 

Por isso, agora sim retomando, estamos vivenciando uma metamorfose kafkaniana com toda perversão possível a tal transformação, onde os docentes estão abrindo mão da sua condição de pensadores, formadores e cidadãos para se tornarem meras ovelhas a serem tangidas de um lado ao outro conforme as oscilações da vontade de cada titular da SEEDUC/RJ.

Eis aí o que chamo de  "ovelhização" do professor da rede pública estadual e em breve (será?), assim como no livro de Franz Kafka teremos o nosso fim (não sem antes sermos tosqueados, rsrsrsrsrsrsr...).

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